O versículo de abertura deste capítulo
mostra como Deus pode usar os grandes homens da Terra sem que percebam, para a realização
de Seus desígnios. O caso aqui é o mais notável, visto que o decreto de Augusto
não foi cumprido imediatamente, mas adiado até que Cirênio fosse governador da Síria.
No entanto, a profecia havia indicado Belém como o local de nascimento do Messias,
e o decreto do imperador veio no tempo certo para enviar José e Maria a Belém, embora,
posteriormente, seu cumprimento tenha sido suspenso por algum tempo. Foi devido
a este perturbado estado de coisas, sem dúvida, que a estalagem estava cheia, e
o fato de que o menino Cristo nasceu em um estábulo foi um testemunho da pobreza
de José e Maria, pois inconvenientes podem sempre ser evitados por dinheiro. No
entanto, era simbólico do lugar separado que Cristo deveria ter desde o início
em relação ao mundo e sua glória.
Os versículos 8-20 se ocupam com o episódio
em conexão com os pastores. Isto se tornou tão conhecido em conexão com hinos e
canções que, talvez, estejamos em perigo de perder seu pleno significado. Os pastores,
como classe, não eram muito estimados naqueles dias, e estes eram os homens que
tinham seu expediente de noite, sem qualificação, em comparação com os homens que
cuidavam das ovelhas durante o dia. Para esses homens extremamente humildes e desconhecidos,
os anjos apareceram. O segredo do céu a respeito da chegada do Salvador foi revelado
a pessoas tão insignificantes como essas!
A coisa se torna ainda mais notável
quando comparamos este capítulo com Mateus 2. Lá a cena acontece entre os grandes
em Jerusalém – o rei Herodes, seus cortesãos, principais sacerdotes e escribas –
e eles são completamente ignorantes deste evento maravilhoso por meses depois, e
então só ouvem falar dele por meio da chegada dos magos do Oriente, homens que eram
completamente estranhos em relação à nação de Israel. A explicação nos é dada nas
palavras do salmista: “O segredo do Senhor
é para os que O temem” (Sl 25:14). Deus não faz acepção à pessoa de ninguém,
mas respeita a humildade e a integridade de coração diante de Si mesmo; então Ele
ultrapassou os grandiosos em Jerusalém, e enviou uma delegação de seres angélicos
para servir um pequeno grupo de desprezados vigias noturnos para que eles pudessem
ser introduzidos no segredo dos caminhos do céu. Esses pastores eram alguns do remanescente
piedoso esperando pelo Messias, como as palavras e ações subsequentes nos mostram.
Primeiro veio a mensagem do anjo e depois
o louvor dos anjos. A grande alegria da mensagem centrou-se no fato de que era como
Salvador que Ele havia vindo. Eles tinham tido o Legislador e os profetas, mas agora
havia chegado o Salvador, e Ele como Cristo, o Senhor, era O grandioso. Essa boa
notícia foi para “todo o povo”
– não “todo povo” como a versão King James apresenta. No momento, um círculo mais
amplo do que todo Israel não está em vista. O sinal deste evento maravilhoso foi
um que nunca poderia ter sido previsto. Os homens poderiam ter esperado ver um poderoso
guerreiro envolto em trajes de glória e sentado em um trono. O sinal era um Bebê
envolto em panos, deitado em uma manjedoura Mas então o sinal indicou toda a maneira
e espírito de Sua aproximação aos homens neste momento.
O louvor dos anjos é compactado em dezesseis
palavras, registradas no versículo 14 – embora poucas em número, eram palavras de
significado profundo. Elas registram os resultados finais que fluiriam do advento
do Bebê. Deus deve ser glorificado nos assentos mais altos de Seu poder, o próprio
lugar onde o mais insignificante insulto lançado sobre Seu nome seria mais intensamente
percebido e sentido. Na Terra, onde desde a queda, guerras e lutas têm sido incessantes,
a paz deve ser estabelecida. Deus encontrará o Seu bom prazer nos homens. “Bom prazer nos homens” é a tradução de
J. N. Darby. Desde o momento em que o pecado entrou não houve prazer para Deus em
Adão ou em sua raça: mas agora havia aparecido aqu’Ele que é de ordem de humanidade
distinta da de Adão, devido ao Virginal nascimento, que tem sido claramente afirmado
no primeiro capítulo. N’Ele o bom prazer de Deus repousa em medida suprema, assim
como repousará nos homens que estão n’Ele como o fruto de Sua obra. Resultados maravilhosos
de fato!
Para tudo isso, os pastores deram a
resposta de fé. Eles não disseram: “Vamos... e vejamos se isso
aconteceu”, mas “Vamos... e vejamos isso
que aconteceu”. Eles vieram apressadamente e viram, com seus próprios
olhos, o Bebê; então prestaram testemunho a outros. Poderiam então dizer: “Deus
tem dito e nós temos visto isto”
– o testemunho divino comprovado por experiência pessoal. Tal testemunho está destinado
a ter efeito. Muitos questionaram, e a própria Maria guardou estas coisas, ponderando-as
em seu coração; pois evidentemente ela ainda não entendia o pleno significado disso
tudo. Quanto aos pastores, eles imitaram o espírito dos anjos, glorificando e louvando
a Deus. Assim houve louvor na Terra bem como louvor no céu nesta grande ocasião; e nos atrevemos a pensar que o louvor
desses humildes homens aqui abaixo tinha em si uma nota que estava ausente do louvor
dos anjos do Seu poder acima.
Nos versículos 21-24 nos é permitido
ver que todas as coisas que a lei ordenou foram observadas no caso da santa
Criança, e quando A apresentaram ao Senhor no templo dois santos idosos, andando
no temor do Senhor, estavam lá para saudá-La como guiados pelo Espírito de Deus.
Acabamos de observar como os grandes homens de Jerusalém estavam totalmente fora
de contato com Deus e não sabiam nada sobre Ele: havia aqueles em contato com Deus
e eles logo souberam, embora nenhum anjo lhes aparecesse. O Espírito Santo estava
sobre Simeão e, pelo Espírito, ele não apenas sabia que deveria ver o Cristo
de Jeová antes de morrer, mas também ele veio no templo no exato momento
em que o menino Jesus estava lá. O mesmo acontece com Ana, já de idade avançada.
Sua visita foi perfeitamente sincronizada, de modo que ela O viu.
Lendo os versículos 28-35, podemos sentir
o quão comovente a cena deve ter sido. O ancião se dirigiu a Deus e depois se dirigiu
a Maria. Ele estava pronto para partir em paz, depois de ter visto a salvação de
Jeová na santa Criança. Ele realmente foi um passo além do anjo, pois ele reconheceu
que a salvação de Deus havia sido preparada diante da face de “todos os povos” – a palavra está no plural
desta vez. Jesus não era apenas para ser a glória de Israel, mas também uma “luz para revelação aos gentios” (TB). Foi
revelado a ele que a graça iria fluir além das estreitas fronteiras de Israel.
Foi revelado a ele também que o Cristo
veio para ser contraditado. Vagamente talvez ele tenha visto isso, mas ali estava
– a sombra da cruz quando a espada deveria atravessar a alma de Maria. Isso aprendemos
com as palavras de Simeão para ela.
Podemos nos maravilhar, talvez, de que
Simeão, tendo sido permitido viver até que efetivamente tivesse o Salvador em seus
braços, estava tão pronto para partir “em
paz”. Poderíamos ter imaginado que ele teria sentido uma coisa tentadora em
ver o começo da intervenção de Deus dessa maneira, e mesmo assim ter que partir
antes que o clímax fosse alcançado. Mas, evidentemente, foi dado a ele, como um
profeta, prever a rejeição de Cristo, e, portanto, ele não esperava a chegada da
glória imediatamente, e estava preparado para partir.
Ele anunciou que a Criança colocaria
Israel em prova. Muitos que eram altos e elevados cairiam, e muitos que eram humildes
e desprezados seriam elevados; e como Ele seria alvo de contradição e rejeitado,
os pensamentos de muitos corações viriam à luz quando entrassem em contato com Ele.
Na presença de Deus todos os homens são forçados a se apresentar em seu verdadeiro
caráter, de forma que esta característica sobre Cristo era um tributo involuntário
à Sua divindade. Além disso, a própria Maria deveria ser traspassada com tristeza,
como por uma espada; uma palavra que se cumpriu quando ela ficou diante da cruz.
A muito idosa Ana, completa esta bela
imagem do remanescente piedoso em Israel. Ela servia a Deus continuamente e, quando
viu o Cristo, “falava d’Ele”.
Podemos recapitular neste ponto, resumindo
as características que marcaram essas pessoas piedosas. Os pastores ilustram a
fé que os caracterizou. Eles aceitaram imediatamente a palavra que chegou a
eles por meio do anjo, então seus próprios olhos verificaram tudo, então glorificaram
e louvaram a Deus.
Maria exemplifica o espírito pensativo
e meditativo, que espera em Deus por entendimento – versículo 19.
Simeão era o homem que estava esperando
o Cristo sob a instrução e poder do Espírito de Deus. Ele estava satisfeito com
Cristo quando ele O encontrou, e profetizou a respeito d’Ele.
Ana foi quem servia a Deus continuamente
e testemunhava do Cristo, quando ela O encontrou.
Por fim, houve grande cuidado em que
todos os detalhes concernentes ao Cristo fossem cumpridos conforme a lei do Senhor
havia ordenado. Cinco vezes acima é afirmado que a lei foi observada – versículos
22, 23, 24, 27 e 39. Esta excelente característica, presumimos, deve ser creditada
a José, o marido de Maria – esta obediência cuidadosa à Palavra de Deus.
Estamos agora esperando por Seu segundo
advento. Como seria bom se, em nossos casos, essas excelentes características fossem
fortemente marcadas.
O versículo 40 abrange os primeiros
doze anos da vida de nosso Senhor. Transmite-nos o fato de que o desenvolvimento
normal da mente e do corpo, que é próprio da humanidade, O marcou; um testemunho
de sua verdadeira Humanidade.
Isto é reforçado também pelo vislumbre
adicional que nos é dado aos doze anos de idade. Ele não estava ensinando os homens
instruídos, mas estava ouvindo-os e fazendo-lhes perguntas de modo a admirarem-se
ao questioná-Lo. Aqui, novamente, vemos que Ele cumpre perfeitamente aquilo que
é próprio de uma criança de tal idade, ao mesmo tempo em que manifesta
características que eram sobrenaturais. Sua resposta à Sua mãe também mostrou que
Ele estava consciente de Sua missão. No entanto, por muitos anos vindouros, Ele
tomou o lugar de sujeição em relação a José e Maria, e assim demonstrou toda a perfeição
humana adequada a Sua idade.