segunda-feira, 1 de julho de 2019

LUCAS 10

LUCAS 10




Tendo os discípulos sido instruídos desta maneira, o Senhor ampliou ainda mais a esfera do testemunho que deveria ser prestado em conexão com Sua presença na Terra, ao nomear e enviar setenta outros discípulos, dois e dois diante de Sua face. Esta declaração sobre a grandeza da ceara e dos poucos trabalhadores parece, segundo Mateus 9:37-38, ter sido proferida em outra ocasião. Lá, a oração é respondida pelo envio dos doze: aqui, pelo envio dos setenta.
As instruções que o Senhor deu aos setenta são semelhantes àquelas dadas aos doze. Deveria haver a mesma simplicidade e ausência de egoísmo, e a mesma dependência n’Ele para o suprimento de suas necessidades. Eles tinham, no entanto, advertências adicionais que indicavam crescente oposição pelo povo. Eles foram informados de que deveriam ser como cordeiros entre lobos, uma comparação muito impressionante. No entanto, apesar da rejeição, deveriam deixar bem claro que o reino estava próximo do povo.
Estes setenta não tinham o lugar distinto dos doze, mesmo assim representavam plenamente o Senhor, como o versículo 16 torna manifesto. Este versículo estabelece o mesmo princípio que Lucas 9:48, só que aqui o Senhor leva o assunto de volta a “aqu’Ele que Me enviou”. Os setenta deviam ser pessoas humildes, talvez dependessem da atitude dos homens em relação à sua mensagem. Cafarnaum e outras cidades daquele dia, tendo este testemunho, teriam maiores responsabilidades; e a rejeição mereceria um julgamento mais severo do que as cidades que nunca tiveram tal testemunho prestado a elas.
Nenhum detalhe é dado sobre o que aconteceu durante o serviço dos setenta, e um versículo (cap. 9:6) foi suficiente para resumir os trabalhos anteriores dos doze. Observamos isso porque Lucas foi escolhido por Deus para registrar os feitos dos discípulos nos Atos; mas isso foi depois que o Espírito Santo foi dado. Antes que o Espírito fosse dado, o trabalho deles tinha muito menos significado, e qualquer luz que houvesse no trabalho era eclipsada pelo brilho da luz perfeita em seu Mestre. No versículo 17, vemos o seu retorno no final de sua missão.
Eles voltaram com gozo, regozijando-se principalmente com o que era mais espetacular – a sujeição de até mesmo demônios por meio do Nome de seu Mestre. Ora isso era realmente uma grande coisa, e uma garantia da derradeira expulsão de Satanás dos céus. A alusão no versículo 18 não é, cremos, a queda original de Satanás, mas a sua expulsão final, como previsto em Apocalipse 12:7-9. O tempo verbal no passado é frequentemente usado em declarações proféticas para descrever eventos futuros. Ele é usado nesses versículos de Apocalipse, como também em Isaías 53:3-9. Assim, o Senhor confirmou a autoridade que naquele momento Ele lhes dera, exercida sobre todo o poder do inimigo, mas ao mesmo tempo indicou algo que ia além de todo poder exercido sobre a Terra.
Ele lhes disse: “vossos nomes estão escritos no céu” (TB). É mais do que provável que naquele momento eles não tenham apreciado a maravilha dessa afirmação. Mais tarde, eles devem ter apreciado isso, e devemos também fazê-lo, já que se aplica também a nós. A figura é simples. Nossos nomes estão inscritos na cidade ou distrito, onde estamos domiciliados. O Senhor disse a esses homens que, na verdade, uma cidadania celestial seria deles, e essa é uma causa de maior regozijo do que qualquer poder conferido na Terra. O evangelho de Lucas nos dá especialmente a transição da lei para a graça e da Terra para o céu, e este versículo é um marco distinto nessa direção. Foi a primeira indicação da verdade que vem completamente à luz em Filipenses 3:20: “nossa cidade [comunidade – JND] está nos céus”.
Naquela mesma hora – a hora do regozijo dos setenta – Jesus mesmo Se regozijou. Ele viu não apenas a queda vindoura de Satanás, com a consequente derrubada de todos os seus desígnios malignos, mas também a ação do Pai para o estabelecimento de todos os Seus desígnios. Na base desses brilhantes desígnios está o fato de que Ele mesmo deve ser perfeitamente revelado e conhecido, e que os “pequeninos”, e não os sábios e prudentes deste mundo, receberão a revelação.
O Filho havia entrado na Humanidade para assim revelar o Pai aos homens. E não apenas isso, Ele é o próprio Herdeiro de todas as coisas. O Homem dependente na Terra sabia que todas as coisas haviam sido entregues a Ele pelo Pai. Além disso, o próprio fato de que Ele Se tornou Homem acrescenta um elemento em Sua causa que desafia todo o entendimento humano. Ele Se tornou Homem para que o Pai fosse conhecido: como Homem, Ele é o Herdeiro de todas as coisas; contudo, que nenhum homem pretenda sondar o mistério que deve cercar uma humilhação tão infinita. Se nos estimamos sábios e prudentes, podemos tentar sondar esse mistério para nossa própria ruína. Se, de fato, somos pequeninos, aceitaremos o mistério com mentes humildes e santas e nos regozijaremos em tudo o que Ele nos revelou do Pai e dos Seus desígnios.
Tendo assim Se regozijado em Sua própria missão, e na graça que tomou os insignificantes “pequeninos”, o Senhor voltou-Se para os discípulos para lhes mostrar a grandeza do presente privilégio que tinham. Eles estavam vendo coisas que tinham sido o desejo dos piedosos de épocas passadas. Eles viram e ouviram coisas que tinham a ver com a manifestação do Pai na Terra, e a realização de uma obra que resultaria no chamado de um povo para o céu. Tudo isso era para o momento privado com os discípulos.
Publicamente, não havia nada além de conflito. A questão do doutor da lei, registrada no versículo 25, aparentemente tão sincera, foi realmente feita com malignas segundas intenções. Ele perguntou o que deveria fazer, e o Senhor, que conhecia o motivo do homem, tratou com ele na base do fazer dele. Era a lei que exigia do homem o que fazer: daí a pergunta do Senhor. Ao dizer que a exigência suprema da lei era o amor; primeiramente para com Deus, e então para com o próximo, o homem respondeu corretamente. Jesus tinha simplesmente que dizer: “Faça isso e viverás” – não “terás a vida eterna”, mas apenas “viverás”. Não há vida para a Terra, a não ser que a lei seja guardada.
O doutor da lei saiu para apanhar o Senhor e agora se viu apanhado por sua própria resposta. Desejoso de justificar-se, ele perguntou quem era seu próximo; como se ele pudesse deduzir que, se ele tivesse próximos suficientemente atraentes, não encontraria dificuldade em amá-los. Essa indagação foi recebida pela parábola do samaritano, e o doutor da lei foi deixado para julgar por si mesmo quem era o seu próximo. Novamente o homem respondeu corretamente, apesar da antipatia sentida pelo judeu contra o samaritano. Assim julgando, ele respondeu à sua própria pergunta, e foi deixado sob a obrigação de agir como o samaritano por um lado, e de amar o samaritano como a ele mesmo por outro lado.
O ensino desta parábola, no entanto, vai além da mera resposta da pergunta do homem. Na ação do samaritano podemos ver uma imagem da graça que marcou a vinda do próprio Senhor. O sacerdote e o levita, representantes do sistema da lei, passaram do outro lado. A lei não foi instituída para ajudar os pecadores, muito menos para salvá-los, e ter o homem meio morto em suas mãos, tanto o sacerdote quanto o levita seriam contaminados e por um tempo desqualificados do exercício de seu ofício. Como o samaritano, Jesus era o Rejeitado, e mesmo assim Ele era o Ministro da graça e da salvação. Se no versículo 20 vemos indicada a transição da Terra para o céu, nesta parábola vemos indicada a transição da lei para a graça.
À luz disso, também está claro que o Senhor Jesus era o melhor e mais verdadeiro Próximo que o homem já teve – o perfeito Próximo, de fato. Ele também era Deus, perfeitamente revelado e conhecido. Deus e o Próximo estavam unidos n’Ele e, ao odiá-Lo e rejeitá-Lo, os homens romperam de imediato e de forma irremediável ambos os valores da lei.
Mas nem todos O rejeitaram: alguns O receberam. E assim acontece no final deste capítulo e na primeira parte de Lucas 11, onde há indicações muito felizes das maneiras pelas quais tais pessoas são colocadas em contato com Ele. Existe a virtude da Sua Palavra, há oração, e o dom vindouro do Espírito Santo.
Maria havia descoberto o poder de Sua Palavra. Isso abriu para Maria uma porta de entrada para os pensamentos de Deus, então sentou-se a Seus pés e O ouviu. Parece que, ao servir, Marta estava apenas cumprindo o dever que, com razão, pertencia a ela. Seu problema era visar muito o servir: ela queria fazer a coisa em um estilo muito especial, e isso a “atrapalhou” ou “distraiu”. Sua distração era tal que ela falou de uma maneira que era uma difamação não apenas para sua irmã, mas para o Senhor. Maria, ela pensou, estava negligenciando seu dever, e o Senhor era indiferente à sua negligência. Marta representa distração e Maria, comunhão.
A distração de Marta foi o resultado de ter muito serviço às mãos, uma coisa que em si é muito boa. Ela se tornou ansiosa e perturbada com muitas coisas, e perdeu a única coisa que é necessária. Maria havia descoberto que tudo o que ela podia fazer pelo Senhor não era nada comparável com o que Ele tinha para transmitir a ela. Receber a Sua palavra é a única coisa necessária, pois dela fluirá todo o serviço que seja aceitável para Ele. É a parte boa, que não deve ser tirada.
Cremos que grande parte da fraqueza que caracteriza os Cristãos atuais pode ser explicada por essa única palavra – distração. Tantas coisas de todos os lados, e muitas vezes inofensivas em si mesmas, nos são apresentadas de forma que nos distraímos da única coisa importante. Podemos nem sempre estar ansiosos e perturbados com elas; podemos estar apenas fascinados e ocupados com elas. Mas o resultado é o mesmo: a única coisa importante é perdida. Então somos verdadeiramente perdedores.

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